09 - SOL DE OUTONO
O sol aquece em dezembro,
o calor saltita de pedra em pedra ao sabor da vontade do astro. O calor ameno
deste dia de outono bate no rosto do menino poeta, aquece-lhe as guelras que
ele não possuí iluminando-lhe as bochechas. O céu iluminado contrasta com a
fealdade dos homens que não existe aqui. Este sítio é tão igual a um outro qualquer
lugar inexistente, e contudo é tão diferente.
O poeta sente urgência em
perpetuar o instante em que uma brisa suave lhe começa a massajar o pescoço. O hálito
é tão perfumado, tão fresco e apetitoso, que ele abre as janelas da casa de par
em par. De imediato uma luz esplendorosa invade o salão e ele apercebe-se da
rotação do planeta. Ao mesmo tempo que observa a linha do horizonte recortada
pelos telhados e pela serrania, questiona-se onde se terá escondido Marília. Desde
que a irmã desapareceu, ele olha para o céu todos os dias, quase sempre à mesma
hora da tarde, para tentar vislumbrar qualquer coisa semelhante ao funil metalizado
que a transportou. Cresceu, fez-se homem sem a sua presença, deixou da a ver
cedo demais.
A silhueta de Marília
assemelha-se às mesmas figuras esguias dos “estrangeiros” que a vieram buscar.
São parte inseparável da mesma recordação fantasmagórica do menino poeta que eles
deixaram ficar para trás.
O sino da aldeia toca por
cinco vezes no terceiro dia mais pequeno do ano. O inverno está quase a chegar,
e isso sente-se quando o sol ameaça despedir-se. A temperatura desce enquanto o
menino poeta permanece sentado na mesma pedra onde viu tudo acontecer. A pedra
é igual, o lugar é o mesmo, mas o tempo é tão outro…
- Meço o som desse
silêncio que aqui deixou de existir. Fecho os olhos e vislumbro as imagens
desfocadas de tudo o que aconteceu e dos espaços que visitei. Ao cérebro
chegam-me sinais ténues de rara beleza.
O menino poeta revê uma
relíquia rara e luminosa, exterior ao nosso planeta azul, que volta a desaparecer
mal o sino da igreja recomeça a tocar.
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